Por vezes fico imaginando o checklist mental de um designer ao sentar-se para criar uma marca: Ler atentamente o briefing, identificar os pontos fortes a serem destacados, conceituar, definir um padrão de identidade tipográfica, estudar as cores, as formas, a harmonização do conjunto, sua legibilidade, viabilidade, aplicabilidade, enfim, uma série de “policies” que devem (ou pelo menos deveriam) reger todo o processo criativo.
Lembro quando fui ler pela primeira vez sobre a moto next 300 ficha técnica era ruim e a marca não estava investindo no designer. Hoje vou mostrar outro lado de grandes marcas que conseguem levar a sério é outro nível.
MARCAS MANUSCRITAS – ASSINATURAS CORPORATIVAS
Mas o que me deixa especialmente curioso é saber em que momento e de que maneira surge o “insight” que define se a marca a ser criada utilizará uma tipografia moderna, clássica, regular, itálica, com ou sem serifas ou será simplesmente um manuscrito.
Simplesmente um manuscrito, eu já ouvi este termo algumas vezes e desde a primeira vez me causou estranhamento, não pelo manuscrito, mas pelo simplesmente.
Se pararmos para observar o padrão de utilização do estilo manuscrito em marcas, certamente iremos nos deparar com situações onde as principais necessidade são: aproximação, humanização, credibilização, fluência, casualidade, classe, refinamento, envolvimento, compromisso, evolução entre outras tantas, e como pudemos ver, estas necessidades não são nada simples, muito pelo contrário, são complexas e requerem atenção.
Vejamos um pouco dessas necessidades, e de como o tipo manuscrito pode contribuir em cada uma delas:
Aproximação
Utilizar estilos manuscritos tende a diminuir as barreiras de assimilação de uma marca, aproximando-a do seu público de uma forma agradável e natural. O fato do manuscrito ser imperfeito, sem padrões duramente definidos é certamente um dos fatores que explicam esta situação. A marca Milka e a P.J. Clarke’s ilustram bem o caso, uma um pouco melhor resolvida e bem acabada, outra menos, porém ambas se utilizam deste artifício.
Humanização
O ser humano tende a se identificar com formas mais soltas e leves, e sempre que uma empresa quer demonstrar descontração e jovialidade recorre a este artifício. Tipos mais retilíneos e padronizados não cumprem bem este papel. A Virgin e a Gol marcam presença por aqui.
Credibilização
Assinatura, estamos acostumados a identificar valor através de assinaturas, que são a forma escrita de se autenticar e validar um contrato e, portanto, selar um acordo. Assinar é garantir que algo será cumprido e por isso, contém um grande valor implícito, transferir isso para a marca é torná-lo explícito, um compromisso de qualidade pelo qual vale a pena o risco. A Disney ilustra bem o caso.
Fluência
A fluidez traz graça e movimento, fazendo da marca um símbolo gráfico ágil, representando muito bem uma situação desenvolta, sem complicações e portanto, extremamente objetiva. Vide a marca Ragdale Hall, linda e de uma simplicidade absurda, mas tentem fazer algo assim e sentiram as dificuldades na pele, é o típico caso de simplicidade ao olhar, tormento ao fazer.
Casualidade
Nada é mais casual do que um texto escrito de próprio punho, usar isto numa marca é demonstrar que, apesar da ausência das “amarras” geradas muitas vezes por excessos de padrões, pode-se chegar a um resultado organizado e belo como nos casos da Ragdale Hall, Virgin e Oxford.
Classe
A construção das chamadas “marcas classudas”, invariavelmente passa pelo dilema: Usar fontes clássicas serifadas ou partir para as manuscritas?
Optando pela segunda opção, o cuidado com a personalização merece atenção redobrada, porque não tem nada mais “manjado” do que simplesmente pegar uma fonte do menu do seu computador, jogá-la lá com o nome que se quer e batizá-la de marca.
Se o tipo utilizado for uma fonte comercial, mesmo que alterar se altere algumas características, ainda assim o resultado final ainda guardará o DNA do tipo original, por isso fica aqui a sugestão, tentem sempre desenhar a própria fonte, isto vai gerar um trabalho mais autoral e proprietário, sem contar no grau de exclusividade né?
Refinamento
Ao utilizar tipos manuscritos, deve-se atentar sempre para o refinamento, a linha divisória entre um tipo bem acabado e um grosseiro é muito tênue e costuma vez por outra pegar muito designer por aí. Ragdalle Hall é refinadíssima, P.J. Clarke’s não, por exemplo.
Envolvimento
Despertar o senso coletivo das pessoas, é neste aspecto que também atuam as marcas que usam tipos manuscritos, para isso sempre aparecem envoltas em tarjas esvoaçantes como a Sara Lee, ou sólidos orgânicos e volumosos como a Bauducco.
Coletividade aqui entenda-se uma empresa gigantesca que depende de inúmeras pessoas na sua cadeia produtiva, porém todas elas comprometidas com um só objetivo, a produção em larga escala, sem perder o toque artesanal.
Trocando em miúdos, seria como se ao utilizar um tipo clássico serifado uma determinada marca dissesse: Possuo um bom produto, me preocupo com você, porém meus métodos priorizam a quantidade, enquanto um tipo manuscrito diria praticamente a mesma coisa trocando a palavra quantidade pela qualidade.
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Compromisso
Subjetivamente somos levados a crer que uma marca manuscrita firma conosco um compromisso mais forte do que as outras.
Verdade?
Nem sempre, mas o compromisso sim, é um dos grandes valores a serem transmitidos, isso sem dúvida.
Pensem na marca Greenpeace sem o tom pessoal de assinatura que ela possui. Perderia muito, provavelmente precisaria de um símbolo de apoio cativante como o panda da WWF, enfim, seria menos. Hoje ela é mais.
Evolução
Nada exprime mais o sentimento de evolução do que um manuscrito, é sempre dinâmico, mutante, se transforma a todo momento, evolui com a gente, mas também guarda aquele sentimento de que somos humanos, imperfeitos e buscamos nos outros o complemento para nossos defeitos.
Assim são as marcas manuscritas, belas, compromissadas, valorosas, mas também possuem defeitos, como: legibilidade ruim, reduções limitadas, assinam mal em mídias eletrônicas, e sempre carregarão aquele ar datado de sempre.
Por isso que aquele “insight” lá do início era tão importante, lembra?